REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE
DECRETO-LEI N.º 8 /2015
de 22 de Abril
Criação do Conselho para a Delimitação Definitiva das Fronteiras Marítimas
Considerando que o povo de Timor-Leste sempre almejou ao exercício pleno de direitos soberanos e jurisdição sobre as suas zonas marítimas, de acordo com a lei internacional;
Considerando que, devido a circunstâncias históricas relacionadas com o período de ocupação da Indonésia, os acordos provisórios têm prolongado o processo de negociação e acordo relativo à delimitação definitiva das fronteiras marítimas de Timor-Leste;
Reconhecendo que a delimitação definitiva das fronteiras marítimas terá um enorme impacto social, político e económico para o povo de Timor-Leste;
Considerando que, de acordo com a alínea f), do n.º 1 do Artigo 115.º da Constituição da República, a preparação e negociação de tratados internacionais é da competência do Governo;
Considerando que, de acordo com n.º 2 do Artigo 6.º da Lei n.º 6/2010, de 12 de maio de 2010, relativa a tratados internacionais, o Governo pode delegar especificamente competências noutros órgãos governamentais para negociar tratados internacionais;
Considerando que a Resolução n.º 12/2014, de 24 de outubro de 2014, do Parlamento Nacional, apoia e concorda com o estabelecimento de um Conselho para a Delimitação Definitiva das Fronteiras Marítimas;
Reconhecendo que a negociação dos acordos tendentes à delimitação definitiva das fronteiras marítimas exige uma intervenção completa do Governo, recursos significativos e a contratação de apoio especializado;
Considerando que a Lei n.º 7/2002, de 24 de agosto, do Parlamento Nacional já fixou e definiu a extensão e o limite das águas territoriais, a zona económica exclusiva e os direitos de Timor-Leste na zona contígua e na plataforma continental;
O Governo decreta, nos termos do n.º 3 do Artigo 115.º da Constituição da República, o seguinte:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Artigo 1º
Objeto
O presente Decreto-Lei estabelece o quadro institucional para alcançar a delimitação definitiva das fronteiras marítimas de Timor-Leste.
Artigo 2º
Instituições
1. É criado o Conselho para a Delimitação Definitiva das Fronteiras Marítimas (Conselho), como um instituto público com personalidade e capacidade jurídica, e com autonomia administrativa e financeira, com o objetivo de coordenar os esforços de Timor-Leste face à delimitação definitiva das respectivas fronteiras marítimas.
2. O Conselho compreende os seguintes orgãos:
a) a Comissão Consultiva (Comissão);
b) o Gabinete das Fronteiras Marítimas (Gabinete); e
c) a Equipa de Negociação.
Artigo 3º
Supervisão
Na medida da autonomia financeira e administrativa conferida por este Decreto-Lei, a Comissão, o Gabinete e à Equipa de Negociação atuam sobre a supervisão direta e tutela do Primeiro-Ministro.
CAPÍTULO II
COMISSÃO
Artigo 4º
Comissão
A Comissão é estabelecida como o órgão máximo de consulta do Primeiro-Ministro nos assuntos relacionados com a delimitação definitiva das fronteiras marítimas.
Artigo 5º
Funções da Comissão
Compete à Comissão, a pedido e de acordo com instruções do Primeiro-Ministro:
a) Prestar conselhos ou emitir recomendações sobre:
i. Quaisquer assuntos ou decisões relativas à delimitação definitiva das fronteiras marítimas;
ii. Quaisquer estratégias ou iniciativas para prosseguir a delimitação definitiva das fronteiras marítimas; e
iii. Regras e Regulamentos Internos que regem a Comissão;
b) Prestar aconselhamento geral quanto à composição da Equipa de Negociação;
c) Reportar ou fornecer detalhes ao Primeiro-Ministro relativamente às opiniões de indivíduos, organizações e membros da comunidade sobre assuntos relacionados com a delimitação definitiva das fronteiras marítimas;
d) Defender e promover os legítimos interesses de Timor-Leste, tanto internamente como internacionalmente, no que respeita a assuntos relacionados com a delimitação definitiva das fronteiras marítimas, de forma consistente com as regras internacionais e apenas de acordo com as instruções do Primeiro-Ministro; e
e) Executar qualquer outra tarefa ou prestar esclarecimentos sobre qualquer outro assunto que o Primeiro-Ministro considere necessário, em relação à prossecução da delimitação definitiva das fronteiras marítimas.
Artigo 6º
Membros da Comissão
A Comissão é composta pelas seguintes pessoas:
a) O Primeiro-Ministro, como Presidente da Comissão;
b) O Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação e outros Ministros cuja participação seja considerada, pelo Primeiro-Ministro, como sendo relevante para a negociação da delimitação das fronteiras marítimas definitivas;
c) Personalidades eminentes da Nação, cuja participação não poderá ser substituída e/ou delegada noutras pessoas, incluindo:
i. antigosPresidentes da República;
ii. antigos Primeiros-Ministros;
iii. antigos Presidentes do Parlamento Nacional; e
d) Qualquer outra pessoa que seja designada pelo Primeiro-Ministro como tendo a reputação, experiência, sabedoria, percurso profissional e reconhecimento público, necessários para contribuir para a Comissão, incluindo líderes de partidos políticos com assento parlamentar, especialistas e membros da sociedade civil.
Artigo 7º
Nomeação e Destituição de Membros
Os membros da Comissão são nomeados e destituídos pelo Primeiro-Ministro.
Artigo 8º
Regras e Regulamentos Internos da Comissão
1. A Comissão criará Regulamentos Internos de funciona-mento, a aprovar pelo Primeiro-Ministro.
2. Quando exista algum conflito entre este Decreto-Lei e as Regras e Regulamentos Internos, este Decreto-Lei prevalecerá.
CAPÍTULO III
GABINETE DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS
Artigo 9º
Gabinete
O Gabinete das Fronteiras Marítimas (Gabinete) é o orgão reasponsável pela gestão executiva do Conselho, com as atribuições previstas nos artigos seguintes.
Artigo 10º
Poderes e Funções do Gabinete para a Delimitação Definitiva das Fronteiras Marítimas
O Gabinete é responsável por:
a) coordenar todos os esforços com vista a assegurar as fron-teiras marítimas definitivas, incluindo:
i. contratação de assistência jurídica e técnica;
ii. desenvolvimento de políticas e estratégias;
iii. envolvimento comunitário; e
iv. relações públicas e comunicações;
b) realizar todas as funções administrativas do Conselho, incluindo:
i. recrutar, despedir e gerir funcionários;
ii. contratar e coordenar consultores e assessores externos;
iii. elaborar orçamentos, administração financeira e reporte da mesma; e
iv. gestão de informação;
c) coordenar os relatórios regulares para o Primeiro-Ministro, sobre todos os aspetos para assegurar a delimitação definitiva das fronteiras marítimas;
d) estabelecer e manter uma biblioteca ou arquivo de recursos e materiais relevantes para assegurar a delimitação definitiva das fronteiras marítimas; e
e) preparar, em consulta com os ministérios e agências governamentais competentes, qualquer material para apresentação pelo Governo a entidades internacionais em relação à delimitação definitiva de fronteiras, incluindo qualquer órgão de resolução de litígios que possa estar envolvido nesta matéria.
Artigo 11º
Apoio à Comissão
Compete ao Gabinete, sob as instruções do Primeiro-Ministro, prestar assistência e apoio à Comissão, incluindo:
a) assistir na redação de Regras e Regulamentos Internos da Comissão;
b) preparar informações ou apresentações para a Comissão;
c) prestar apoio logístico às reuniões da Comissão;
d) prestar apoio técnico ou aconselhamento especializado à Comissão;
e) quaisquer outras tarefas tidas por necessárias, pelo Primeiro-Ministro, para o funcionamento regular da Comissão; e
f) qualquer outra ação que apoie ou prossiga a delimitação definitiva das fronteiras marítimas.
Artigo 12º
Apoio à Equipa de Negociação
O Gabinete prestará o apoio necessário à Equipa de Negociação através:
a) da preparação de materiais e informação para as negocia-ções;
b) da prestação de qualquer apoio técnico necessário à Equipa de Negociação na elaboração ou desenvolvimento de estratégias, perspetivas, táticas e relatórios relativos à negociação;
c) da prestação de apoio logístico e coordenação para as negociações; e
d) de quaisquer outras tarefas, consideradas necessárias pelo Primeiro-Ministro, para o funcionamento e apoio apropriado à Equipa de Negociação.
Artigo 13º
Regras e Procedimentos
1. O Gabinete deverá desenvolver Regras e Procedimentos para regular todos os aspetos do seu funcionamento, incluindo a sua gestão, relatórios internos e atividade diária.
2. Em caso de conflito entre as Regras e Procedimentos e este Decreto-Lei, este Decreto-Lei prevalecerá.
Artigo 14º
Diretor Executivo
1. O Gabinete é chefiado por um Diretor Executivo, que será responsável por executar todas as atribuições e funções do Gabinete tal como estabelecidas no presente Decreto-Lei.
2. O Primeiro-Ministro tem o poder de nomear e destituir o Diretor Executivo.
Artigo 15º
Recrutamento e Consultores
1. Com a exceção do Diretor Executivo do Gabinete, todos os funcionários e consultores contratados pelo Gabinete estarão sujeitos às regras de recrutamento vigentes, a não ser que a contratação por ajuste direto seja justificada por uma necessidade imediata.
2. Não obstante quaisquer leis existentes que estabeleçam o contrário, aos funcionários públicos que venham a exercer funções junto ao Gabinete são aplicáveis os termos previstos no artigo 33.º da Lei N.º 8/2004, de 5 de maio.
CAPÍTULO IV
EQUIPA DE NEGOCIAÇÃO
Artigo 16º
Equipa de Negociação
A Equipa de Negociação é o órgão responsável pela execução das negociações relacionadas com a delimitação definitiva das fronteiras marítimas, exceto relativamente a interações de nível governamental.
Artigo 17º
Composição
1. A Equipa de Negociação será composta pelo Negociador Principal e uma equipa de assessores nacionais e internacionais, bem como consultores externos.
2. Nos termos do artigo 6.º, n.º 2 da Lei n.º 6/2010, de 12 de maio, relativa a Tratados Internacionais, a Equipa de Negociação deverá incluir, pelo menos, um Jurista.
3. O Negociador Principal pode nomear e destituir os membros da Equipa de Negociação sob consulta com o Primeiro-Ministro.
Artigo 18º
Negociador Principal
O Negociador Principal é o líder da Equipa de Negociação e o representante de Timor-Leste em todas as interações diretas, entre Estados, relacionadas com a delimitação definitiva das fronteiras marítimas, exceto relativamente a interações de nível governamental.
Artigo 19º
Nomeação do Negociador Principal
Compete ao Primeiro-Ministro a nomeação e a destituição do Negociador Principal.
Artigo 20º
Funções do Negociador Principal
O Negociador Principal é responsável por:
a) representar Timor-Leste em discussões bilaterais ou multilaterais diretas relacionadas com a delimitação definitiva das fronteiras marítimas;
b) desenvolver, em consulta com o Gabinete, estratégias-chave de negociação, incluindo perspetivas, táticas e objetivos;
c) liderar a implementação de planos e estratégias de negociação;
d) gerir e dirigir a Equipa de Negociação na implementação de estratégias de negociação;
e) reportar ao Primeiro-Ministro através do Gabinete os progressos e resultados das discussões, incluindo quaisquer acordos, planos ou processos propostos; e
f) qualquer outra tarefa que o Primeiro-Ministro considere necessária, em relação às negociações sobre a delimitação definitiva das fronteiras marítimas.
CAPÍTULO V
ORÇAMENTO E COMUNICAÇÃO
Artigo 21º
Financiamento
1. O financiamento do Conselho será assegurado por dotação específica prevista no Orçamento Geral do Estado.
2. O Conselho será dotado de uma conta bancária autónoma, gerida pelo Gabinete, para onde serão transferidos os fundos a utilizar pelo Conselho.
3. O Gabinete prepara e apresenta uma Proposta de Programa de Trabalhos e um Orçamento ao Primeiro-Ministro antes do início de cada ciclo orçamental do Governo, apresentando um requerimento de fundos para o próximo exercício orçamental.
4. Uma vez aprovado, o Primeiro-Ministro irá supervisionar a execução da transferência de fundos para o Conselho, no início do exercício orçamental sobre o qual a Proposta de Programa de Trabalhos e o Orçamento dizem respeito.
5. Se, devido a circunstâncias imprevistas, os fundos forem insuficientes para cobrir um determinado exercício orçamental, o Gabinete poderá apresentar um Programa de Trabalhos e Orçamento Revistos ao Primeiro-Ministro no sentido de permitir a transferência de fundos adicionais para o Conselho.
6. O Gabinete tem autonomia para gerir e usar os fundos que lhe forem disponibilizados.
Artigo22º
Contratação pública
1. O Gabinete é responsável por contratar diretamente todos os bens, serviços e equipamento necessário para o funcionamento apropriado da Comissão e da Equipa de Negociação.
2. A menos que tal seja justificado por necessidade imediata, toda a contratação está sujeita ao regime legal de aprovisionamento, tal como previsto nas Políticas e Procedimentos do Gabinete.
Artigo23º
RelatórioAnual
1. O Gabinete deverá apresentar um Relatório Anual ao Primeiro-Ministro relativo às atividades do Conselho, e à administração dos fundos, em cada ano civil.
2. O Relatório Anual deverá ser apresentado ao Primeiro-Ministro até ao final de março do ano subsequente ao ano a que o Relatório Anual diz respeito.
3. O Primeiro-Ministro irá apresentar o Relatório Anual ao Parlamento.
Artigo 24º
Fiscal Único
1. O fiscal único é o orgão responsável pelo controlo da regularidade, boa gestão financeira e patrimonial do Conselho.
2. O fiscal único é nomeado pelo Primeiro-Ministro para um mandato de 3 (três) anos, renovável, podendo a sua exoneração ter apenas por fundamento o incumprimento grave dos seus deveres funcionais ou negligência grosseira.
Artigo 25º
Competências do Fiscal Único
O fiscal único é competente para:
a) verificar e fiscalizar a escrituração, livros e registos contabilísticos do Conselho; e
b) informar o Primeiro-Ministro sobre eventuais irregularidades encontradas no exercício da sua atividade.
Artigo 26º
Auditorias externas
O Primeiro-Ministro pode, a qualquer momento, determinar a realização de auditorias externas ao Conselho e pode ordenar ao Conselho que realize quaisquer auditorias externas e disponibilize relatórios de forma periódica.
CAPÍTULO VII
DISPOSIÇÕES DIVERSAS
Artigo 27º
Obrigação de consulta
O Primeiro-Ministro pode instruir ministérios, agências estatais e instituições financiadas pelo Governo a consultar o Gabinete sobre quaisquer matérias, questões, decisões e ações que possam vir a ter impacto na negociação de fronteiras marítimas definitivas.
Artigo 28º
Confidencialidade
1. Os atuais e antigos membros da Comissão, os membros da Equipa de Negociação e todos os funcionários, consultores e indivíduos contratados pelo Gabinete estão sujeitos a uma obrigação contínua de estrita confidencialidade e segredo, nos termos do disposto no artigo 200º do Código Penal.
2. Não obstante qualquer outra norma deste Decreto-Lei, a não ser que tal seja expressamente autorizado em contrário pelo Primeiro-Ministro, pelo Negociador Principal ou pelo Diretor Executivo do Gabinete, todas as pessoas e organizações estão proibidas de divulgar informação, ou documentos, adquiridos em relação com o seu envolvimento quer com o Gabinete, com a Comissão ou com a Equipa de Negociação.
3. Todas as pessoas e organizações deverão devolver qualquer informação ou documentação ao Gabinete após o fim do seu envolvimento com o mesmo, com a Comissão ou com a Equipa de Negociação.
Artigo 29º
Dúvidas e omissões
Quaisquer dúvidas que resultem da execução e interpretação deste Decreto-Lei serão resolvidas pelo Primeiro-Ministro ou pelo Conselho de Ministros.
Artigo 30º
Revogação
É revogado o Decreto-Lei n.º 2/2015, de 14 de janeiro.
Artigo 31º
Entrada em vigor
Este Decreto-Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação no Jornal da República.
Aprovado em Conselho de Ministros em 08 de Abril de 2015.
O Primeiro-Ministro,
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Rui Maria de Araújo
Promulgado em 20 / 04 / 2015
Publique-se.
O Presidente da República,
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Taur Matan Ruak