REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE
REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE
Lei Parlamento
3/2012
Autorização Legislativa em Matéria Ambiental
Os desafios que o país enfrenta ao nível da proteção e conservação ambientais, exigem a definição urgente das bases de uma política ambiental.
O Parlamento Nacional tem competência legislativa para definir as bases de uma política para a defesa do meio ambiente e o desenvolvimento estável, podendo autorizar o Governo a legislar sobre a matéria, nos termos da alínea h) do n.º 1 do artigo 96.º da Constituição da República Democrática de Timor-Leste.
A opção pelo mecanismo constitucional da autorização legislativa potencia uma maior celeridade do processo legislativo. O Parlamento Nacional define as linhas de política legislativa que devem orientar a elaboração do diploma, remetendo para o Governo a harmonização dos aspetos de técnica jurídica, subordinada às diretivas emanadas pelo Parlamento Nacional.
O conteúdo e a extensão da autorização legislativa para a aprovação da Lei de Bases do Ambiente, cumprem o mandado constitucional de proteção e conservação do ambiente e dos recursos naturais como pilares essenciais ao desenvolvimento sustentável da nação. São igualmente considerados os princípios gerais de proteção do ambiente, os diversos instrumentos internacionais já ratificados por Timor-Leste, e as particulares circunstâncias económicas, sócio-culturais e de insularidade do país.
O Parlamento Nacional decreta, ao abrigo do previsto na alínea h) do n.º 1 do artigo 96.º da Constituição da República, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
É concedida autorização ao Governo para aprovar a Lei de Bases do Ambiente.
Artigo 2.º
Sentido e extensão
1. A Lei de Bases do Ambiente elaborada ao abrigo da presente lei de autorização legislativa deve observar os princípios e as normas constitucionais de proteção e conservação do ambiente, preservação e uso sustentável dos recursos naturais, bem como as normas constantes em instrumentos internacionais em matéria ambiental.
2. A autorização tem o seguinte sentido e extensão:
a) Estabelecer um conjunto de definições relacionadas com o ambiente e essenciais à interpretação da Lei de Bases do Ambiente;
b) Construir um sistema jurídico-ambiental através da definição das bases da política do ambiente, dos princípios orientadores para a conservação e proteção do ambiente e para a preservação e uso sustentável dos recursos naturais de forma a promover a qualidade de vida dos cidadãos;
c) Delimitar o âmbito de aplicação da lei a todo o território nacional, nomeadamente à superfície terrestre, às águas interiores, ao mar territorial, ao espaço aéreo sobre o mar territorial, ao seu leito, subsolo e à Zona Económica Exclusiva;
d) Delimitar o âmbito de aplicação da lei a todas as pessoas singulares e coletivas, nacionais, internacionais e apátridas, incluindo entidades públicas que se encontrem, residam ou exerçam atividade em Timor-Leste;
e) Estabelecer um conjunto de objetivos a prosseguir pelo Estado na promoção de um ambiente sadio e ecologica-mente equilibrado, propício à saúde e ao bem-estar das pessoas que preserve o uso sustentável dos recursos naturais, nomeadamente:
i) Reduzir as pressões ambientais, através da dissociação entre a utilização dos recursos naturais e o crescimento económico;
ii) Melhorar o desempenho ambiental das entidades públicas e privadas;
iii) Garantir a existência e a efetividade dos mecanismos de avaliação ambiental sempre que sejam produzidos efeitos significativos sobre o ambiente;
iv) Criar, desenvolver e gerir áreas protegidas, para prote-ção das espécies e habitats, de forma a garantir a conser-vação da natureza e biodiversidade;
f) Consagrar o princípio da soberania da República Demo-crática de Timor-Leste na exploração dos seus recursos naturais e na responsabilidade de assegurar que as atividades desenvolvidas no seu território não prejudicam o ambiente de outros Estados;
g) Consagrar o princípio da solidariedade das gerações visando a proteção do ambiente em prol das gerações futuras;
h) Consagrar o princípio da prevenção, no sentido que os programas, planos ou projetos suscetíveis de alterarem a qualidade do ambiente antecipem, previnam, reduzam ou eliminem as causas prioritariamente à correção dos efeitos;
i) Consagrar o princípio da precaução, no sentido que a falta de certeza científica de risco de dano grave ou irreversível para o ambiente não deva ser usada como razão para se adiar as medidas eficazes para impedir ou minimizar tais efeitos;
j) Consagrar o princípio da participação, visando a participação, individual ou coletiva, dos diferentes grupos sociais nos processos de decisão ambiental, na formulação e execução da política e de legislação de cariz ambiental;
k) Consagrar o princípio do poluidor pagador de forma a que os custos das medidas de prevenção, combate, redução e compensação das atividades com efeitos negativos no ambiente sejam suportados pelo poluidor;
l) Consagrar o princípio da cooperação internacional visando a procura de soluções internacionais para os problemas transfronteiriços do ambiente e para a preservação e uso dos recursos naturais;
m) Consagrar o princípio da integração, de forma a que a polí-tica do ambiente seja integrada nas restantes políticas públicas sectoriais;
n) Consagrar o princípio da procura do nível mais adequado de ação para que a execução das medidas da política ambiental sejam aplicadas ao nível sectorial, local, regional, nacional ou internacional, conforme o mais indicado;
o) Prever o direito de participação dos cidadãos, a título indi-vidual ou através de associações coletivas, na conservação e proteção ambiental;
p) Garantir o direito dos cidadãos de acesso à informação e à educação ambientais, bem como de participação nos processos de tomada de decisão ambiental;
q) Garantir a legitimidade processual aos cidadãos para intervir em processos judiciais para a defesa do ambiente, independente do interesse pessoal na demanda;
r) Prever o dever dos cidadãos na conservação, proteção e melhoria do ambiente e das diferentes componentes ambientais, bem como de preservação e uso sustentável dos recursos naturais de forma a fomentar o desenvolvi-mento sustentável;
s) Prever o dever dos cidadãos de participação nos mecanis-mos de decisão ambiental, bem como o dever de informação às autoridades competentes das atividades, ações ou omissões de que tenham conhecimento e que possam ameaçar o ambiente ou constituir infração à legislação ambiental em vigor;
t) Estender, com as devidas adaptações, os direitos e os deveres previstos para as pessoas singulares às pessoas coletivas;
u) Reconhecer a importância do Tara Bandu, como direito consuetudinário local e a validade das suas ações sempre que compatíveis com os princípios estabelecidos na Lei de Bases do Ambiente;
v) Estabelecer uma estrutura governamental central capaz de coordenar com as demais entidades públicas centrais, distritais ou locais as políticas, programas, planos ou projetos com efeitos significativos no meio ambiente;
w) Consagrar a importância da participação das autoridades comunitárias na conservação e proteção do ambiente, na preservação e uso sustentável dos recursos naturais e nos processos de decisão ambiental;
x) Reconhecer a importância do envolvimento e participação das comunidades locais, por si ou através de associações coletivas, nos processos de decisão ambiental, nomeada-mente através da consulta pública;
y) Consagrar a necessidade de promover uma avaliação ambiental estratégica que descreva e avalie dos efeitos no ambiente e que garanta a integração dos valores ambientais nos procedimentos públicos de tomada de decisão;
z) Prever criação de padrões de qualidade e emissão ambiental para os diferentes componentes ambientais, nomeada-mente, água, mar, ar, solo e subsolo;
aa) Prever um sistema de avaliação e licenciamento ambien-tal para a implementação de programas, planos ou projetos da responsabilidade ou iniciativa de institui-ções públicas ou privadas que possam afetar o ambiente, o território, a qualidade de vida, a saúde humana e os componentes ambientais;
bb) Estabelecer um sistema de monitorização ambiental capaz de exercer o controlo integrado da poluição, avaliar a qualidade dos componentes ambientais, o estado de exploração dos recursos naturais, dos impactos ambientais causados pelas atividades económicas e o cumprimento do disposto na legislação ambiental;
cc) Reconhecer que a política ambiental deve ser integrada nas restantes políticas públicas sectoriais, nomeada-mente nas políticas dos setores da agricultura, das florestas, das pescas, da energia, da indústria, dos transportes, da gestão de resíduos, de gestão das águas, das telecomunicações, do turismo, do ordena-mento do território e da utilização dos solos e do subsolo, prevendo-se, simultaneamente, o dever de colaboração entre todas as entidades públicas na promoção e planeamento das políticas públicas de desenvolvimento, de forma a assegurar que as mesmas são compatíveis com a política ambiental;
dd) Prever especificamente a adequada e harmoniosa orga-nização do território nacional, na perspetiva da sua valorização, estabelecendo-se que este deve ter em conta as particularidades das áreas residenciais, comerciais e industriais, bem como a necessidade de enquadrar a gestão integrada dos recursos hídricos;
ee) Prever especificamente a implementação complementar e compatível da política ambiental com a política energética e industrial, de forma a promover a eficiência energética, o uso sustentável das fontes de energia, dos recursos renováveis e da produção de energias alternativas;
ff) Prever especificamente a implementação complementar e compatível da política ambiental com a política agrícola, florestal e pesqueira, no sentido de incentivar a atividade económia dos meios e dos territórios rurais e do mar, bem como o uso sustentável do solo, da água e do mar;
gg) Prever especificamente a implementação complementar e compatível da política ambiental com a política do turismo, de forma a promover o uso do património natural como fonte de riqueza, através da promoção de práticas turísticas ambientalmente sustentáveis;
hh) Estabelecer a responsabilidade do Estado na proteção, conservação e uso sustentável dos componentes ambientais, sem prejuízo do princípio do poluidor pagador;
ii) Prever a necessidade, que incumbe ao Estado, de criação dos mecanismos necessários à proteção, manutenção e melhoria da qualidade do ar, a adoção de medidas de controlo integrado da poluição atmosférica, da produção, uso, importação ou exportação de substân-cias com efeitos nocivos na camada do ozono;
jj) Prever a necessidade, que incumbe ao Estado, de prote-ção, conservação e melhoria da quantidade e da quali-dade das águas superficiais e subterrâneas, através da adoção de um plano de gestão hídrica que promova o seu uso sustentável;
kk) Prever a necessidade, que incumbe ao Estado, de assegurar a gestão integrada da costa marinha, como base para a conservação, proteção e uso sustentável dos recursos do mar, dos ecossistemas e das espécies marinhas, que tenha em conta os limites dos processos naturais e o equilíbrio a longo prazo dos componentes ambientais, económicos, sociais, culturais e recreativos;
ll) Prever a necessidade, que incumbe ao Estado, de definir e implementar uma política integrada de conservação, proteção, uso sustentável e reabilitação do solo e do subsolo, de forma a prevenir a sua degradação, erosão e contaminação, assegurando a sua capacidade produtiva, promovendo a adoção de métodos alterna-tivos ao uso de pesticidas e definindo as medidas necessárias preventivas e reparadoras que minimizem os efeitos da erosão do solo;
mm) Consagrar a importância da definição de uma estraté-gica de conservação da biodiversidade que assegure a proteção e conservação das espécies, dos seus habitats, a reprodução das espécies ameaçadas ou em vias de extinção, a reabilitação e restauração dos habitats degradados, a manutenção de um sistema nacional de áreas protegidas e o acesso equitativo dos benefícios resultantes do uso sustentável dos recursos genéticos e do conhecimento tradicional;
nn) Prever a necessidade, que incumbe ao Estado, de assegurar a conservação, proteção e uso sustentável das espécies e ecossistemas terrestres, costeiros, marinhos, das zonas húmidas ou de outros ecossis-temas aquáticos e dos seus componentes, através da aprovação de medidas para a manutenção e regeneração das espécies, do controlo das ameaças às espécies exóticas e invasivas e do uso de substâncias suscetíveis de degradar ou prejudicar as espécies e os habitats;
oo) Reconhecer a importância da defesa, valorização e preservação do património ambiental, entendido no sentido de englobar o património natural, cultural, histórico e paisagístico e de assegurar o envolvimento das comunidades;
pp) Determinar que a extração de recursos naturais não renováveis deve ser feita de modo sustentável nos termos da lei, que define as áreas específicas, a dimensão e o volume da extração, as medidas que minimizem e mitiguem o impacto ambiental da atividade extrativa, a monitorização de tais atividades, o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental, de planos de gestão ambiental e de medidas destinadas a dar resposta a incidentes ocorridos;
qq) Especificar que a extração de areia e gravilha dos rios, leitos dos rios, praias ou qualquer outra área apenas pode ser feita, nos termos da lei, mediante a atribuição de autorização expressa e mediante o pagamento da competente taxa, cabendo ao extrator os custos de reabilitação da área se objeto de degradação ambiental, nos termos definidos por lei;
rr) Estabelecer a responsabilidade do Estado na adoção de medidas de controlo da poluição, nomeadamente através da sujeição do lançamento e descarga de poluentes para os diversos componentes ambientais, aos padrões de qualidade e emissão ambiental emitidos;
ss) Consagrar a necessidade de controlo da poluição do ar e de implementação de medidas necessárias de adaptação e mitigação às alterações climáticas;
tt) Prever a importância do controlo da poluição das águas e da criação e manutenção dos meios necessários ao seu tratamento;
uu) Estabelecer a necessidade de controlo da poluição sonora e da vibração, sobretudo em zonas residenciais, bem como da poluição visual que possa ter efeitos adversos na saúde pública, nos componentes ambientais e nas espécies ameaçadas ou em vias de extinção;
vv) Consagrar a necessidade de criação de um sistema de gestão de resíduos sólidos, de recolha, transporte, armazenamento, redução, reutilização e reciclagem dos mesmos, nomeadamente através da criação de aterros construídos de forma a evitar a contaminação dos lençóis freáticos;
ww) Prever a necessidade de criação de mecanismos pró-prios para o tratamento de águas residuais;
xx) Proibir a importação de resíduos perigosos e a sujeição ao consentimento prévio do Estado da importação de químicos perigosos;
yy) Consagrar medidas financeiras e instrumentos econó-micos, nomeadamente através da criação de um fundo ambiental e da previsão da possibilidade de criação de taxas para a prestação de serviços proporcionados pelo ambiente;
zz) Estabelecer a possibilidade de criação de isenções e benefícios fiscais para atividades, produção ou importação de tecnologias limpas e ambientalmente sustentáveis, bem como a criação de mecanismos de distribuição equitativa dos benefícios proporcionados pelo ambiente;
aaa) Prever a necessidade de criação de um sistema de informação ambiental organizado e sistemático que fomente a partilha de informação entre as entidades públicas e entre estas e as entidades privadas, garantindo-se a prestação de informação gratuita ao público;
bbb) Prever a necessidade de existência de um sistema de educação ambiental eficaz, quer nos sistemas formais de ensino quer nos sistemas não formais e de educação cívica, promovendo-se a investigação científica neste campo;
ccc) Prever a criação de mecanismos descentralizados de aplicação e fiscalização da legislação ambiental, nomeadamente através da participação dos cidadãos no processo de fiscalização;
ddd) Consagrar a responsabilidade, que incumbe ao Estado, do estabelecimento de um sistema integrado de resposta a situações de emergência ambiental causados por intervenção humana ou desastres naturais, sem prejuízo do princípio do poluidor pagador;
eee) Especificar a obrigatoriedade de contratação de seguro de responsabilidade civil e prever-se a possibilidade de exigência de garantia, sempre que esteja em causa a aplicação e implementação de programas, planos ou projetos sujeitos ao regime da avaliação e licenciamento ambiental;
fff) Prever a responsabilidade contraordenacional das violações à legislação ambiental, independente da responsabilidade criminal prevista no Código Penal e da responsabilidade civil a que haja lugar;
ggg) Consagrar a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao ambiente;
hhh) Estabelecer um conjunto de sanções acessórias que podem ser aplicadas como resultado da violação da legislação ambiental;
iii) Prever a obrigatoriedade de reparação do dano ambiental através da reposição do estado anterior ou, na sua impossibilidade, do pagamento de compensação;
jjj) Garantir a tutela jurisdicional através da consagração do direito de recurso aos tribunais para defesa dos direitos subjetivos violados e para defesa do ambiente;
kkk) Consagrar a possibilidade de criação de um sistema de resolução alternativa de litígios ambientais e de uso dos mecanismos tradicionais existentes, desde que em conformidade com o disposto na lei e não aplicáveis aos crimes ambientais;
lll) Estabelecer disposições finais e transitórias, nomeadamente para a previsão da necessidade de auditorias ambientais para os programas, planos e projetos que, à data da entrada em vigor da Lei, se encontrem em funcionamento sem observação das medidas de proteção ambiental necessárias.
Artigo 3.º
Revogação
A autorização legislativa objeto da presente lei abrange também a revogação de toda a legislação contrária ao estabelecido na Lei de Bases do Ambiente.
Artigo 4.º
Duração
A autorização legislativa concedida pela presente lei tem a duração de 120 dias, contados da data da sua entrada em vigor.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Aprovada em 19 de Dezembro de 2011.
O Presidente do Parlamento Nacional,
Fernando La Sama de Araújo
Promulgado em 12 / 01 / 2012 .
Publique-se.
O Presidente da República,
José Ramos-Horta