REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE
REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE
Decreto-Lei
9/2010
ASSISTÊNCIA MÉDICA NO ESTRANGEIRO
A Lei n.º 10/2004, de 24 de Novembro, relativa ao Sistema de Saúde, permite, no n.º 2 do seu artigo 22.º, que, em circunstâncias excepcionais, se recorra a assistência médica no estrangeiro, para garantir os cuidados de saúde aos beneficiários do sistema nacional de saúde.
Não obstante o esforço financeiro que o Governo vem desenvolvendo, no sentido de modernizar as unidades hospitalares e de melhorar a qualidade técnica e científica dos profissionais da saúde, importa reconhecer, todavia, que o país não dispõe ainda de recursos técnicos e humanos que lhe permitam fornecer, em certas áreas, cuidados de saúde qualitativamente similares aos prestados no estrangeiro.
Tem, pois, especial relevância e excepcionalidade o problema da assistência médica no estrangeiro aos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde, pelo que importa desde já regulamentá-la, definindo com clareza os critérios para a sua atribuição, assim como as responsabilidades dos diversos intervenientes no processo, nomeadamente, do médico assistente, do paciente e da Junta Médica Nacional, que, aqui e desde já, fica instituída.
Assim,
O Governo decreta, nos termos conjugados das alíneas o) e p) do n.º1 do artigo 115.º e da alínea d) do artigo 116.º da Constituição, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º
Âmbito de aplicação
1. O presente diploma regula a assistência médica no estrangeiro que, por falta de meios técnicos ou humanos, não possa ser prestada em Timor-Leste.
2. Nos termos do previsto no n.º 2 do artigo 22.º da Lei n.º 10/2004, de 24 de Novembro, a assistência médica nos estrangeiro é prestada apenas em circunstâncias excepcionais em que seja impossível garantir em Timor-Leste cuidados de saúde essenciais nas condições exigíveis de segurança, e em que seja possível fazê-lo no estrangeiro a custos razoáveis e havendo verba para tal.
3. São abrangidos pelo presente diploma os beneficiários do Serviço Nacional de Saúde.
4. Excluem-se do âmbito do presente diploma:
a) As propostas de deslocação ao estrangeiro que pro-venham de instituições privadas;
b) As propostas de deslocação ao estrangeiro motivadas por razões de ordem social ou política ou qualquer outra que não seja de natureza estritamente médica, nos termos previstos nos n.º 1 e 2.
5. Com o objectivo de facilitar a avaliação das situações médi-cas, é aprovado, por despacho do Ministro da Saúde um guia descritivo de tratamentos, intervenções ou exames de diagnóstico essenciais que, por impossibilidade material ou humana, não podem ser realizados em estabelecimento de saúde nacional.
6. O guia a que se refere o artigo anterior é meramente exem-plificativo e deve mencionar, relativamente a cada tratamento, intervenção ou exame de diagnóstico, o meio material ou humano inexistente no país para o efeito e as instituições estrangeiras onde os mesmos possam ser prestados, com qualidade, a custos razoáveis.
Artigo 2.º
Requisitos
São condições essenciais para a atribuição dos benefícios previstos no artigo 10.º:
a) A existência de um relatório médico com um pedido de assistência médica no estrangeiro, devidamente detalhado e justificado, a elaborar pelo médico que tenha acom-panhado a assistência ao doente e, salvo casos de urgência, a declaração do consentimento deste ou de quem legalmente o represente;
b) A confirmação do relatório referido na alínea anterior por parte da Junta Médica Nacional, nos termos do previsto no n.º 3 e seguintes do artigo 4.º;
c) A decisão favorável do Director-Geral do Hospital Nacional Guido Valadares, tendo em conta os relatórios referidos nas alíneas anteriores.
Artigo 3.º
Conteúdo e procedimento do pedido de assistência
1. Compete ao médico do Serviço Nacional de Saúde que tenha acompanhado a assistência ao doente formular e justificar o pedido de assistência médica no estrangeiro.
2. O relatório com o pedido de assistência médica no estran-geiro, especificará, designadamente:
a) Descrição circunstanciada e actualizada à data do pedido da condição do doente;
b) Os tratamentos, intervenções ou exames de diagnóstico já efectuados;
c) Os tratamentos, intervenções ou exames de diagnóstico necessários;
d) As razões que justificam a impossibilidade, material ou humana, dos tratamentos, intervenções ou exames de diagnóstico poderem ser realizados em estabelecimento de saúde nacional;
e) O objectivo clínico da deslocação; e
f) O prazo máximo dentro do qual devem ter lugar os tratamentos, intervenções ou exames de diagnóstico, sob pena de não virem a produzir o seu efeito útil normal.
3. O pedido é dirigido ao Director-Geral do Hospital Nacional Guido Valadares e remetido, por este, para o presidente da Junta Médica Nacional.
4. Junto com o pedido é enviado o processo clínico do doente.
Artigo 4.º
Junta Médica Nacional
1. É constituída, para funcionar junto ao Hospital Nacional Guido Valadares, uma Junta Médica Nacional para análise dos pedidos de assistência médica no estrangeiro.
2. A composição, em número ímpar de membros, e o fun-cionamento da Junta Médica Nacional são definidos por despacho do Ministro da Saúde.
3. Para efeitos do presente diploma, e sem prejuízo de funções específicas que venham a ser-lhe cometidas, compete à Junta Médica Nacional:
a) Elaborar a proposta do guia descritivo a que se refere o n.º 5 do artigo 1.º, bem como propostas de revisão do mesmo, sempre que tal se mostre adequado;
b) Elaborar propostas de celebração de protocolos de as-sistência médica com serviços hospitalares e unidades de saúde estrangeiros adequados à resolução de cada situação;
c) Elaborar relatório médico, em face dos pedidos que lhe sejam remetidos, e pronunciar-se sobre as situações clínicas que necessitem de ser tratadas no estrangeiro, nos termos do previsto no presente diploma.
4. Com vista à elaboração do relatório médico, a Junta Médica Nacional pode determinar a realização de exames complementares ou a repetição de exames, sempre que necessário, para a correcta avaliação da situação do doente.
5. O relatório da Junta Médica Nacional deve conter uma recomendação clara relativamente à decisão do pedido de assistência médica no estrangeiro, pronunciando-se especificamente sobre cada ponto do mesmo.
6. Caso os tratamentos, intervenções ou exames de diagnós-tico a realizar não se encontrem previstos no guia descritivo a que se refere o n.º 5 do artigo 1.º, o relatório da Junta Mé-dica deverá justificar a essencialidade dos mesmos e a impossibilidade de os realizar em território nacional.
7. Em caso de parecer favorável, o relatório da Junta Médica Nacional deve conter:
a) A indicação das instituições estrangeiras em que o doente pode ser diagnosticado, tratado ou submetido a intervenção cirúrgica, tendo em conta o previsto no guia descritivo a que se refere o n.º 5 do artigo 1.º;
b) A indicação, devidamente fundamentada, de ser ou não necessário utilizar na deslocação qualquer meio de transporte especial;
c) A indicação, devidamente fundamentada, de o doente carecer ou não de acompanhante, com ou sem pre-paração técnica adequada.
8. A indicação das instituições a que se refere a alínea a) do número anterior é feita por ordem de preferência decres-cente devidamente fundamentada.
Artigo 5.º
Poder decisório e modo de actuação
1. É da competência do Director-Geral do Hospital Nacional Guido Valadares a decisão dos processos de assistência médica no estrangeiro que lhe sejam submetidos, atentos os requisitos previstos no artigo 2.º.
2. Da decisão e das diligências efectuadas deve dar-se conhecimento, pela forma mais expedita, aos interessados, nos termos do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 32/2008, de 20 de Junho.
3. A decisão a que se referem os números anteriores deve ser proferida e comunicada aos interessados no prazo de 15 dias, contados da data do registo de entrada do pedido de assistência junto do Director-Geral do Hospital Nacional Guido Valadares.
4. Da decisão desfavorável cabe recurso para o Ministro da Saúde, que decidirá no prazo de 30 dias contados a partir da data em que o mesmo lhe tenha sido remetido.
Artigo 6.º
Casos excepcionalmente urgentes
Em caso de excepcional urgência, comprovada por relatório médico, e verificados os pressupostos referidos no artigo 2.º, os prazos previstos nos n.ºs 3 e 4 do artigo anterior são reduzidos para cinco dias.
Artigo 7.º
Celebração de protocolos ou acordos preferenciais com instituições estrangeiras
Sob proposta da Junta Médica Nacional e mediante autorização do Ministro da Saúde, podem ser celebrados pelo Director-Geral do Hospital Nacional Guido Valadares com o objectivo de conseguir um atendimento preferencial, protocolos de assistência médica com serviços hospitalares e unidades de saúde estrangeiros onde os cuidados de saúde previstos no guia descritivo a que se refere o n.º 5 do artigo 1.º possam ser prestados, com qualidade, a custos razoáveis.
Artigo 8.º
Encaminhamento do processo
1. Em caso de decisão favorável, compete ao Director-Geral do Hospital Nacional Guido Valadares:
a) Designar acompanhante com preparação técnica ade-quada, quando necessário;
b) Formular o pedido de financiamento, nos termos do artigo 9.º e encaminhar o processo para a Direcção Nacional dos Serviços Hospitalares e de Encaminha-mento do Ministério da Saúde.
2. Compete à Direcção Nacional dos Serviços Hospitalares e de Encaminhamento do Ministério da Saúde:
a) Verificar o processo, de modo a confirmar se estão reu-nidos os requisitos previstos no artigo 2.º e se o mesmo vem acompanhado de todos os documentos previstos no artigo 9.º;
b) Indicar qual a instituição de saúde em que o diagnóstico, tratamento ou intervenção terá lugar, tendo em conta o relatório da Junta Médica Nacional e a disponibilidade para receber o doente;
c) Efectuar, em tempo útil, face ao disposto na alínea f) do n.º 2 do artigo 3.º, as diligências necessárias para a confirmação da existência de disponibilidade para receber o doente, solicitando à instituição estrangeira designada a marcação dos tratamentos, exames, diagnósticos ou intervenções cirúrgicas necessários;
d) Elaborar orçamento com a estimativa dos custos para a realização, na instituição estrangeira indicada no relatório da Junta Médica Nacional, dos tratamentos, exames diagnósticos ou intervenções cirúrgicas necessários;
e) Efectuar todas as diligências necessárias com vista à preparação da viagem e estadia do doente no estrangeiro bem como do respectivo acompanhante;
f) Proceder ao pagamento de despesas nos termos do previsto no artigo 10.º;
g) Providenciar serviços de transporte, alojamento e apoio permanente em países estrangeiros, sempre que tal se mostre conveniente em virtude do volume de assistência médica aí prestada nos termos do presente diploma.
3. Os processos que não reúnam todos os requisitos previstos no artigo 2.º ou não venham acompanhados de todos os documentos previstos no artigo 9.º serão devolvidos ao Director-Geral do Hospital Nacional Guido Valadares para revisão.
Artigo 9.º
Pedido de financiamento
O pedido de financiamento a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo anterior deve ser acompanhado dos seguintes documentos:
a) Fotocópia do relatório favorável da Junta Médica Nacional a que se refere o artigo 4.º devidamente aprovado nos termos do artigo 5.º ou 6.º;
b) Fotocópia de documento de identificação do doente e da pessoa que tenha a sua guarda, no caso de este ser menor de 17 anos;
c) Fotocópia de documento de identificação da pessoa com preparação técnica designada para acompanhar o doente, caso tal seja necessário.
Artigo 10.º
Pagamento das despesas
1. As despesas resultantes da prestação de assistência médica e medicamentosa e os gastos com alojamento, alimentação e viagem, na classe mais económica, obtenção de vistos e emissão de passaportes são da responsabilidade dos serviços competentes do Ministério da Saúde.
2. Os serviços competentes devem proceder aos adiantamen-tos que se revelem necessários e aos depósitos-caução que forem eventualmente solicitados pelas instituições estrangeiras.
3. Para efeitos do disposto nos números anteriores, é criada no orçamento dos serviços competentes uma rubrica própria que contemple as necessidades previsíveis.
4. Quando o Estado timorense fornecer, a qualquer título, alojamento, alimentação e/ou transporte no estrangeiro, a responsabilidade pelo pagamento das despesas da mesma natureza só subsistirá nos casos em que houver indicação clínica em contrário.
5. Os serviços competentes do Ministério da Saúde respon-sabilizam-se pela repatriação de cadáver de doentes que venham a falecer no estrangeiro durante o período de prestação de cuidados de saúde no âmbito do presente diploma.
6. Nos termos do previsto no artigo 21.º da Lei n.º 10/2004, de 24 de Novembro, podem ser estabelecidas contribuições acessíveis pela prestação de cuidados de saúde no âmbito do presente diploma.
Artigo 11.º
Cooperação
1. As entidades governamentais cooperam com o Ministério da Saúde na implementação deste diploma.
2. O Ministério dos Negócios Estrangeiros apoia o Ministério da Saúde e o Hospital Nacional Guido Valadares, nomeadamente no que respeita aos contactos e à celebração de protocolos ou acordos preferenciais com instituições estrangeiras, às diligências necessárias com vista à preparação da viagem e estadia do doente no estrangeiro bem como ao apoio aos pacientes enquanto permaneçam no estrangeiro.
Artigo 12.º
Regulamentação
O Ministério da Saúde elabora os regulamentos necessários à execução do presente diploma.
Artigo 13.º
Disposições transitórias
Até ao final do presente ano as competências previstas nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 8.º e dos números 1 a 5 do artigo 9.º são desempenhadas e suportadas pelo Ministério da Solidariedade Social, que, para o efeito, deve prestar ao Ministério da Saúde a necessária colaboração.
Artigo 14.
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor decorridos trinta dias sobre a sua publicação.
Aprovado em Conselho de Ministros a 11 de Maio de 2010.
O Primeiro-Ministro,
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Kay Rala Xanana Gusmão
O Ministro da Saúde,
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Nelson Martins
A Ministra da Solidariedade Social,
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Maria Domingas Fernandes Alves
Promulgado em 9 / 7/ 10
Publique-se.
O Presidente da República,
_________________
José Ramos-Horta